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DIÁRIO DE VIAGEM IX, 1ª parte – O Paraguai em seu labirinto

O Paraguai tem um encontro marcado com uma crise institucional. 

O Presidente Lugo elegeu-se para um mandato de mudança que não tem condições de cumprir, mantido o atual quadro político do país. 

A maioria precária de que dispõe no Congresso paraguaio tende a se evaporar rapidamente e ser substituída por uma frente dos principais partidos – Colorado, UNACE e PLRA – contrária ao seu governo. 

O Presidente do Congresso (senador pela UNACE, do general Lino Oviedo), o critica pesada e abertamente. O mesmo faz o Presidente da Suprema Corte de Justiça. Este chega a dizer que o chefe do executivo quer “sabotar as instituições nacionais”. 

De sua parte, Lugo quer substituir toda a Corte Suprema, sem ter maioria no Senado para tanto. Além de defender publicamente a inutilidade da Vice-Presidência da República e a extinção do cargo,ocupado por Luis Federico Franco Gómez, indicado pelo principal partido que lhe dá sustentação, o PLRA. 

A reforma agrária não tem como caminhar, por não dispor de recursos, estrutura e, sobretudo, de uma legislação que permita sua realização. Logo, o horizonte provável será a agudização dos conflitos no campo, induzidos pelos movimentos sociais e a previsível reação do empresariado e do latifúndio. Neste cenário, a situação dos “brasiguaios” tende a se deteriorar gravemente e nos arrastar para o centro do conflito. 

Com um aparelho de Estado débil – a arrecadação de impostos alcança irrisórios 11% do PIB – é impossível financiar um mínimo de gastos sociais, infra-estrutura e a administração pública. Isso, em um país em que se avalia que 33% a 42% da população vive em condições de pobreza e extrema pobreza, e com renda per capita de US$ 1.904 em 2007, dá a dimensão dos desafios da atual gestão. 

Passados quase seis meses de sua posse, o Presidente Lugo não deu sinais, nem passos claros, na direção do que deseja fazer e de quais seriam suas prioridades. Esta semiparalisia se choca com as grandes esperanças que sua eleição promoveu, tanto interna como externamente. 

Em verdade, a presidência Lugo é um típico “caso de manual” aonde a organização de um novo pacto político e constitucional se faz mais que necessária, é imperativa – em que pese os riscos de tal aposta.  

Da forma como se organizam e articulam as instituições e forças políticas no Paraguai, é impossível vislumbrar o sucesso do mandato conferido ao atual Presidente, nos termos do seu programa de mudanças. Lugo, lembremos, na sua resposta à pergunta sobre a necessidade de uma constituinte, foi ambíguo, não a afirmando, nem rejeitando. 

As forças, lideranças e partidos do “ancien régime” colorado, seus aliados e dissidências, estão claramente se rearticulando e consolidando posições. A demora de Lugo em mover-se inquieta, impacienta e, mais adiante, dividirá e subtrairá apoios conquistados ao longo da sua caminhada rumo à presidência. E que talvez lhe faltem na hora decisiva. 

Em resumo, caso não se decida rapidamente por empregar o seu cacife político na costura e realização de um novo pacto político no Paraguai, Lugo será bloqueado  e resvalará para um ciclo de instabilidade e crise.

Ainda que sua deposição não esteja no horizonte, sobretudo dado o cenário sul-americano e o apoio ostensivo do Brasil.

A seguir: DIÁRIO DE VIAGEM IX, 2ª parte – Brasiguaios, Itaipu, Brasil

DIÁRIO DE VIAGEM IX, 2ª parte – Brasiguaios, Itaipu, Brasil

O Presidente Lugo joga a carta dos “brasiguaios” nas negociações de Itaipu? Aparentemente, sim. O que é grave. 

De outra forma, como explicar que passados cinco meses de sua posse ainda não tenha depositado o acordo de residência e migração do Mercosul, aprovado pelo Congresso paraguaio no apagar das luzes do governo anterior?  Ou será porque se trata de legislação do governo Nicanor Duarte Frutos, como nos disse o seu vice-chanceler? Ou, ainda, que o assunto encontra-se em estudo, como nos afirmou o Presidente? É claro que não. 

O acordo data de quatro anos, quando foi firmado pelo Brasil, Argentina e Uruguai. A legislação nada tem de complexa. Denunciar o que foi recém aprovado pelo parlamento não é politicamente viável, logo…  Difícil tirar outra conclusão. Até porque a ratificação do acordo, além de criar a base para a legalização dos “brasiguaios”, beneficiará paraguaios vivendo no Brasil em situação similar. 

Até que se dê o depósito do acordo, a situação dos brasileiros em território paraguaio não será fácil. Aliás, conforme admitiu o chanceler Celso Amorim, numa resposta extensa e honesta a um requerimento de informações nosso. 

Jogar diplomaticamente com a segurança de 300 ou 400 mil “brasiguaios” é inadmissível e isso tem que ficar bem claro ao nosso vizinho A vida de nossos cidadãos não é ou poderá ser moeda de troca em nenhuma hipótese. Cabe à nossa diplomacia ser clara quanto a essa situação e suas implicações perante o Congresso Nacional e a opinião pública brasileira. Além de tomar as medidas cabíveis, requeridas e inadiáveis para encaminhar uma solução tempestiva para o problema. 

Quanto a Itaipu, duas observações. 

A binacional deve explicações ao parlamento brasileiro e paraguaio quanto à “caixa preta” do seu orçamento operacional, doméstico. Nós e os paraguaios não podemos ter acesso a estas contas por se tratar de um empreendimento binacional, alegam. Ou seja, Itaipu, construída 100% com recursos públicos, não é fiscalizada publicamente por nenhum dos lados… 

Donde, em outro plano, a auditoria da dívida global, estimada em US$ 19 bi e já acertada entre os dois paises é muito bem vinda. 

A segunda observação remete aos pontos estratégicos para nós.  

A disponibilidade paraguaia de colocar a sua energia, 50% do que é gerado por Itaipu, em condições de mercado para o Brasil, Argentina ou Chile, é inegociável. Idem a zeragem da dívida que resta do financiamento contratado. Já a construção da estação da margem esquerda, que dará ao Paraguai o controle operacional da energia que lhe cabe e que nos é revendida, caso aceita, deverá ser cercada de salvaguardas adicionais. 

Somadas, as agendas – “brasiguaios” e Itaipu – tem imenso potencial de pressão e conflito sobre a pauta bilateral dos dois países. Isso, num quadro que caminha para uma crise política do lado paraguaio, não é, em absoluto, um bom presságio. 

Finalizando e em que pese todo o contencioso exposto ao longo desses “Diários”, o apoio ao Presidente Lugo, por parte do Brasil e no limite do total respeito à soberania paraguaia, é o que melhor convém ao interesse nacional.  

O retorno ao status quo anterior representa, a médio e longo prazo, o adiamento de soluções para problemas estruturais do nosso vizinho, com conseqüências nefastas para paraguaios e “brasiguaios” mais adiante. 

Liderar, juntamente com a Argentina e no contexto do Mercosul, um amplo processo de redução das assimetrias e desigualdades vis a vis o Paraguai, de modo consistente e planejado, nos parece muito mais adequado que a política de “generosidade” para com o vizinho, cujo paternalismo, assistencialismo e improvisação, se atenuam crises, em nada resolvem o essencial: paz e segurança para todos. Estas, apenas o desenvolvimento social e econômico sustentável de Brasil e Paraguai pode assegurar. 

A seguir: DIÁRIO DE VIAGEM X – Sta. Cruz, Cochabamba e. . . brasileiros, claro!

DIÁRIO DE VIAGEM VIII – Enfim, “brasiguaios”

A embaixada brasileira em Assunção é ampla, bem conservada e possui um teatro com mais de 250 lugares e que leva o nome de Maestro Antonio Carlos Jobim. Segundo o nosso eficiente embaixador Eduardo Santos, a sala é uma das melhores e mais requisitadas da capital e serve aos propósitos de promoção e intercâmbio cultural entre os dois países. 

Lá, nos aguardavam entre 50 a 60 brasileiros que vivem no Paraguai, a maioria homens, entre agricultores, estudantes, empresários e profissionais liberais. 

Enquanto ficávamos no palco, sob as luzes cênicas, nossos interlocutores, na platéia, flutuavam numa penumbra que dificultava-nos ver suas faces, ainda que os ouvíssemos bem. 

Feita a nossa “overture” de praxe, a cabo do Presidente Gadelha, passamos a ouvir nossos convidados e suas condições de vida, razão última da nossa viagem até ali. 

Como “persona ou fala coletiva”, as atenções concentraram-se nos seguintes pontos: 

  • Terras & segurança

“os maiores problemas estão em San Pedro e próximo a Ciudad del Leste”
“as invasões de terras vem se sucedendo há 9 anos, sem providências concretas”(Itapuá)
“ele, Lugo, promete mas não cumpre”
“com polícia não dá (para fazer reintegração de posse). Só com dinheiro na frente”
“não temos segurança”
“a qualquer momento pode ocorrer uma tragédia…”
“vendi minha propriedade para cortar pressão”
“não existe segurança política, nem policial, nem de Estado”
“tem caso de ordem de reintegração de posse descumprida por ordem presidencial”
“devíamos trazer a Embrapa para cá”
“quem tocou fogo nesse país foi o Lugo com o Chávez”
“1.5 milhões de hectares de terras destinadas à reforma agrária estão abandonados” 

  • Brasileiros & paraguaios 

“os governos não educaram os agricultores paraguaios”
“tamos dando calmante…”
“nós tamos  detestados aqui!”
“eles, o governo, não quer saber de brasileiro”
“paguem o dinheiro que investimos e voltamos para o Brasil”
“eles, os paraguaios, são contra a plantação de soja”
“os campesinos paraguaios não sabem plantar”
“simularam um assalto para inviabilizar o prefeito brasiguaio de San Alberto”
“os paraguaios trabalham fora. Aqui dentro, não”
“Brasil não cumpre acordos com o Paraguai”
“o Paraguai foi tranqüilo até que chegou Evo e tomou as refinarias e deu o exemplo”
“em 2009, com a crise, a coisa vai piorar”
“o Brasil tem que ser generoso na questão de Itaipu”
“eles ensinam nas escolas, às crianças deles, que o Brasil tomou tudo ao Paraguai”
“o chavismo é um perigo por aqui!”
“se o Brasil ganha do futebol para eles, é péssimo pra nós” 

  • Maconha & drogas

“o Paraguai produz 15% da maconha do mundo”
“50% da maconha produzida se concentra em San Pedro”
“eles querem assentamento para tráfico de drogas”
“há 25 anos atrás lá (Amambay) era só maconha”
“culpados pela marijuana são os pecuaristas. Eles vão invadindo e plantando maconha”
“queimamos 23 toneladas de maconha”
“além de San Pedro, também tem muita maconha em Canindeyú” 

Temas outros foram tratados pelos brasileiros presentes. Desde problemas consulares e com a Receita Federal, até questões referentes a duplo CPF e transporte de cargas. Os assuntos principais, porém, foram os que vão acima: terras, relações com os paraguaios e maconha. A ligar esses três temas, um sentimento de insegurança e apreensão. Sob controle, sem dúvida, mas crescente. 

O momento de maior emoção se deu quando um agricultor de San Pedro, Almery Francisco, que sofre pressão constante de sem terras, caiu num choro descontrolado. 

Em resposta, o embaixador Eduardo Santos listou as copiosas ações da embaixada para proteger os direitos e cidadãos brasileiros. No que foi seguido pelo nosso cônsul geral no Paraguai. 

Todos nós falamos também – Marcondes, Décio, Cajado e eu – e nos comprometemos a levar ao Congresso Nacional e ao ministro Celso Amorim o que ouvíramos ali (e além). 

Cansados após quase três horas de reunião, dirigimo-nos à residência do embaixador Eduardo Santos, aonde teríamos em seguida o jantar de despedida. 

No caminho fui remoendo pedaços, frases, gestos, conflitos e expressões da prolongada cena coletiva que acabáramos de assistir e participar. Saímos, como se diz, “pesados”, não resta dúvida, nem poderia ser diferente. Porque, ainda que ali não tivéssemos uma amostra perfeita da comunidade brasileira que vivia por lá, e que, talvez, vozes e falas outras dos ausentes, que se estivessem presentes poderiam modificar o balanço final, aquele era um grupo preocupado, na defensiva, óbvio.  

Já chegando à casa do embaixador, tive a certeza que aquela nossa missão quase “clandestina”, tinha valido a pena. Desde que dela déssemos conhecimento o mais amplo possível e que cumpríssemos o prometido.

A seguir: DIÁRIO DE VIAGEM IX, 1ª parte – O Paraguai em seu labirinto

DIÁRIO DE VIAGEM VII – “Eu sou você… ontem”

Foi com uma ponta de curiosidade pessoal que fui ao nosso derradeiro encontro com autoridades paraguaias, pouco antes do almoço, naquela sexta feira quente e abafada de Assunção. Dentro de instantes, iríamos conversar com Alberto Alderete, presidente do INDERT – Instituto Nacional de Desenvolvimento Rural e da Terra. Afinal, durante seis longos e árduos anos lidei com o tema da reforma agrária, como presidente do INCRA e Ministro do Desenvolvimento Agrário. 

Antes de iniciar a reunião, como fizera em todos os encontros anteriores, reli o briefing com os dados e o histórico do setor, preparados pela nossa embaixada e o currículo do titular do INDERT, o mais extenso e copioso de todos, noves fora os dos nossos colegas parlamentares… 

Chegamos à sala do presidente do INDERT depois de passar por corredores e salas de um prédio baixo, algo mal conservado, com vários carros encostados no pátio interno – um ambiente que contrastava com a importância por todos atribuída à reforma agrária no Paraguai. 

Moreno, magro, formal e atencioso, Alderete principiou nos informando seu contentamento com a assinatura de um acordo de cooperação com o Brasil na sua área. Em seguida, passou a discorrer sobre as estratégias do atual governo para reestruturação fundiária tão desejada. Segundo ele, são quatro os principais mecanismos: a compra direta de terras pelo Estado; a expropriação pública; a recuperação das terras ditas “malhabidas” – glebas públicas irregularmente distribuídas pela ditadura; e, por fim, recuperação de lotes destinados à reforma agrária e que foram negociados de forma irregular e, posteriormente, vendidos a preços até dez vezes abaixo do valor de mercado a não beneficiários do programa. 

De pronto, senti pena e solidariedade pelo nosso anfitrião. Com a imensa tarefa e responsabilidade de realizar uma reforma agrária num país de 406.752 km² e 6 milhões de habitantes, dos quais 42%, ou seja 2.5 milhões, vivendo no campo, ele não contava, nem de longe, com mecanismos executivos para fazer face ao desafio. 

A recuperação de terras, os dois últimos dos quatro dispositivos citados, é sempre uma batalha longa, custosa e incerta, no contexto de uma legislação conservadora. Já a compra direta de áreas é mecanismo acessório de uma reestruturação agrária, dado o seu alto custo. Quanto à sonora “expropriação pública de terras” citada, retornemos a palavra ao presidente do INDERT. 

No Paraguai, explicou-nos didaticamente, a expropriação só é feita mediante depósito prévio e à vista do valor das terras. E com “autorização do Congresso, mediante lei”… O que coloca o nosso Estatuto da Terra, de novembro de 64, na condição de legislação quase revolucionária, sem sombra de dúvida. 

Alderete não foi capaz de nos dizer qual o estoque de famílias a atender via reforma e tão pouco o tempo e custo global unitário por família assentada. Pedida uma estimativa, disse-nos que algo em torno de 29% da população rural não tinha terras, o que totalizaria cerca de 120 mil famílias. 

Quanto aos recursos de que dispõe anualmente, revelou dispor de 25 milhões de dólares, o suficiente para assentar 3 mil famílias ao ano. O que demandaria 40 anos para que se assentassem todas as famílias existentes, mantido o atual volume de recursos. 

Interessante (?) notar que os recursos do INDERT e da reforma não provém do tesouro paraguaio, mas sim dos royalties pagos por Itaipu (5%) e do retorno financeiro das vendas de terras públicas a terceiros. 

Nada a estranhar, portanto, quando nosso anfitrião se disse pessimista sobre a possibilidade de alcançar “resultados significativos”. Na sua visão, os avanços ocorrerão, mas serão limitados. 

Quanto aos “brasiguaios”, ressaltou que o INDERT cuida apenas de terras públicas. E que muitos dos nossos compraram terras de particulares. Como os demais entrevistados, afirmou ignorar o número real de “brasiguaios” e que muitos tinham comprado ilegalmente “derecheras”. O que, claro, os colocaria na mira do Instituto. Entretanto, enfatizou inexistir qualquer discriminação, contra quem quer que seja e de qualquer nacionalidade. Mas, lembrou, desde 2004 que as áreas para assentamento destinam-se exclusivamente a paraguaios. 

Chegada a hora de partir para a próxima parada da nossa agenda, agradecemos a atenção e corremos para a van, rumo à embaixada e ao encontro com a comunidade brasileira residente no Paraguai. 

Ah, sim! A resposta do ministro Filizzola à pergunta sobre qual a solução para a reforma agrária. Disse-nos ele que a “atual legislação dificulta (sic) a realização de um projeto como desejam o Presidente Lugo e os sem terra”. 

Alguém discorda?

A seguir: DIÁRIO DE VIAGEM VIII – Enfim, “brasiguaios”

DIÁRIO DE VIAGEM VI – Reforma Agrária, essa velha conhecida…

Rafael Filizzola, Ministro do Interior, 40 anos completos, foi o mais jovem dos dirigentes com quem nos entrevistamos. Fundador e ex-presidente do minúsculo PDP – Partido Democrático Progressista, com apenas um deputado e um senador, possui uma carreira de destaque no legislativo paraguaio, tendo, aos 30 anos e em primeiro mandato, assumido a vice-presidência da Comissão de Assuntos Constitucionais da Câmara de Deputados.

De estilo gerencial, objetivo e direto, nos recebeu em seu amplo gabinete, às cinco e meia da tarde de quinta feira, quatro de dezembro.

Feitas as apresentações e tendo nosso coordenador, Marcondes Gadelha, exposto os motivos da nossa visita, abordamos a questão dos conflitos de terra.

De saída, o ministro reconheceu que, após as eleições, houve um aumento de invasões de terra, embora por motivações distintas. Essas incluiriam desde questionamentos sobre a origem de certas propriedades, a acusações de uso indevido de agrotóxicos, além do uso nocivo de reservas ambientais das propriedades invadidas para o corte de madeira e o desejo de alguns grupos de causar “caos social”. Mencionou, ainda, uma possível vinculação de alguns sem-terra com o narcotráfico.

Para Filizzola, porém, a situação hoje seria bem mais estável. E que jamais, de sua memória, viu um governo atuar de forma tão firme para garantir a propriedade privada como o atual. 

Confrontado com a queixa freqüente, pelo que se lê na mídia, sobre ordens judiciais de reintegração de posse não cumpridas, negou que tal ocorra. Assegurou-nos ter a Polícia Nacional “capacidade operativa para agir, desde que haja amparo legal” (sic). 

Perguntei-lhe, então, qual avaliação fazia sobre o plantio de maconha no Paraguai e formas de cooperação e ajuda do Brasil no combate ao problema. Segundo estimativas, o Paraguai seria um dos maiores produtores mundiais de maconha, sendo 70% dela exportada para o Brasil. 

Pela primeira e única vez, o ministro mostrou-se preocupado. Ressalvando que este era um assunto sobre o qual pouco se fala, no longo prazo poderia vir a “afetar a governabilidade do país”. Destacou que, embora não generalizada, existe uma vinculação real entre o plantio da maconha e o conflito fundiário. Preocupava-o serem os recursos parcos e, portanto, a cooperação do Brasil seria bem vinda. 

A esta altura, o embaixador Eduardo Santos nos fazia gestos nada discretos chamando nossa atenção. Estávamos atrasados para o próximo encontro. Então, lancei-lhe uma última pergunta sobre qual seria a solução para a um tema recorrente desde que pisáramos em terras paraguaias, a reforma agrária. 

A resposta que nos deu o ministro Filizzola, o caro leitor ficará sabendo quando passarmos ao post seguinte deste “diário”. Não perca. 

A seguir: DIÁRIO DE VIAGEM VII – “Eu sou você… ontem”

DIÁRIO DE VIAGEM I – Problemas e razões

Entre os dias 4 e 9 de Dezembro, estivemos em missão oficial no Paraguai e Bolívia, num périplo que nos levou de Assunção a La Paz, passando por Santa Cruz de La Sierra e Cochabamba.

Éramos quatro parlamentares: o presidente da Comissão de Relações Exteriores, Marcondes Gadelha, do PSB/PB, que nos comandava, eu, Cláudio Cajado, do DEM/BA e Décio Lima, do PT/SC.

Os requerimentos que deram origem à missão foram de  minha autoria, sendo o primeiro deles, solicitando a ida ao Paraguai, apresentado quatro meses atrás. O da Bolívia foi um pouco mais recente.

Os motivos da demora foram vários. Mas, visível mesmo, foi a resistência do presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, em tornar nossa comitiva oficial, portanto credora de passagens e diárias custeadas pela Casa. Ao final, fomos sem autorização da Mesa e apenas com a autorização da nossa Comissão. Decisivo foi contar com a boa vontade da Aeronáutica, que nos cedeu um avião.

O restante foi todo custeado por nós, do próprio bolso. Senão, não iríamos nunca.

 E, finalmente: porque ir até lá?

No Paraguai, preocupava-nos a situação dos 150, 300 ou 400 mil “brasiguaios” – nunca se sabe ao certo – vivendo em grande parte da terra, com situação jurídica indefinida e sob pressão crescente dos meus velhos conhecidos do lado de cá: os sem terra. De quebra, conhecer o ponto de vista paraguaio sobre a disputa envolvendo a hidrelétrica de Itaipu.

Na Bolívia, onde eu estivera um ano antes, a agenda era mais elástica. Ia desde a regularização dos brasileiros que lá vivem, passando pela reforma agrária que afeta produtores nossos radicados em Santa Cruz de La Sierra, até o descontrole na produção da folha de coca. Transformada em pasta, a folha de coca vem sendo apreendida nas nossas fronteiras em quantidades crescentes pela Polícia Federal, a caminho de São Paulo ou do Rio de Janeiro.

Por volta das 11h de uma quinta feira ensolarada e quente, decolamos da base área de Brasília.

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