DIÁRIO DE VIAGEM V – Cobras e Lagartos, 2ª parte | Raul Jungmann

DIÁRIO DE VIAGEM V – Cobras e Lagartos, 2ª parte

A Corte Suprema de Justiça, a mais alta instância do judiciário paraguaio, não é, como o nosso STF, um tribunal constitucional, strictu sensu. Além de matérias constitucionais, ela decide em última instância sobre matéria penal e cível, sendo composta por nove membros indicados pelo Senado da República.

Entretanto, segundo o presidente da Corte, Víctor Manuel Nuñez Rodriguez, o número atual de membros titulares é de oito, passados 14 meses que a indicação do 9º titular está emperrada no Senado, por razões políticas, nos diz ele, resignado. O conflito com o Senado não para por aí e é mais grave.

Segundo Víctor Nuñez, Senado e Corte Suprema não se entendem quanto à duração do mandato dos ministros. Para o Senado, o mandato seria de cinco anos e, para a CSJ, até o limite dos 75 anos de idade. Quem decide quem sai e quando, é a pergunta óbvia que fazemos ao presidente, que dá de ombros e nos diz algo como um “pois é”. E ficamos nisso.

Aliás, o Presidente se queixa de ser alvo de uma campanha difamatória, dirigida contra sua honra. Queixa-se amargamente também, que o presidente Lugo fez toda sua campanha afirmando desejar destituir toda a Suprema Corte por ser ela partidária e ligada, em sua maioria, ao partido Colorado. E conclui afirmando ser rotina todo novo chefe do executivo querer ter o “seu” CSJ.

O conflito entre os poderes executivo e judiciário é agravado pelo fato do ex-presidente Nicanor Duarte Frutos ter indicado seis dos atuais oito membros da Corte, sendo que dois deles foram “impichados”. Donde, segundo ele, Lugo deverá recorrer ao mesmo processo de impeachment, para ter uma maioria sua. O que é pouco plausível, já que a Constituição exige maioria de dois terços do Senado para tanto. O que nem de longe está ao alcance do ex-bispo de San Pedro.

Ouvindo Víctor Nuñez falar, fico pensando nos conflitos entre poderes que temos no Brasil. E, não resta dúvida, eles ficam pequenos, quase diminutos, diante do quadro que González Quintana, antes, e o presidente da CSJ, agora, nos pintam.

Para encerrar, expomos nossas preocupações com as invasões de terras dos “brasiguaios”, que vem se multiplicando, e ao fato de, em alguns casos, as forças policiais se recusarem a cumprir ordens judiciais de reintegração de posse.

Víctor Nuñez reconheceu que tais situações têm ocorrido com certa freqüência. Sendo o principal motivo do não cumprimento das sentenças judiciais, o fato que a legislação paraguaia não contempla a figura do desacato à ordem judicial… Ou seja, nada mais nada menos o oposto do que nos dissera horas antes o sr. Ministro do Interior, Rafael Filizzola, conforme relataremos a seguir.

Sombrio, o Presidente da Corte Suprema de Justiça afirmou que a debilidade institucional no Paraguai poderia conduzir o país à anarquia. E que sofria uma pressão poderosa para renunciar ao seu posto. Finalizou comentando pretender o Partido Liberal, do vice presidente Luis Federico Franco Gómez, ter Lugo como refém. Ou fora do poder.

Feitas as despedidas e agradecimentos de praxe, saímos em silêncio. Que foi quebrado, já na van que nos transportava a todos, pelo baiano Cláudio Cajado, ao afirmar que, para um dia que mal começava, aquele prometia bastante!

A seguir: DIÁRIO DE VIAGEM VI – Reforma Agrária, essa velha conhecida…