Grupo capitaneado por Mick Jagger comemora cinco décadas de estrada | Raul Jungmann

Grupo capitaneado por Mick Jagger comemora cinco décadas de estrada

“PEDRAS QUE ROLAM NUNCA ENVELHECEM”

Redação do DIARIODEPERNAMBUCO.COM.BR  25/05/2012 | 09h50 | Rollig Stones

Foi por acaso que Mick Jagger e Keith Richards, amigos de infância, se encontraram na estação de trem de Dart-fort (no condado britânico de Kent), depois de anos sem se verem, em 17 de outubro de 1961. Jagger, recém-chegado à maior idade, carregava embaixo do braço discos de Muddy Waters e Chuck Berry, dois dos artistas americanos favoritos de Richards, então com 17 anos. O interesse musical em comum reatou a amizade entre os dois. A dupla ainda não sabia, mas ali estava plantada a semente daquela que se tornaria a maior banda de rock de todos os tempos.

Com alguns amigos, eles formaram a banda Little Boy Blue and the Blue Boys, que não durou muito tempo. Poucos meses depois, a convite do guitarrista Brian Jones, Jagger e Richards se juntariam a ele numa nova empreitada. Em maio de 1962, com Jones e Richards nas guitarras, Dick Taylor no baixo, Jagger nos vocais, Ian St ewart no piano e Tony Chapman na bateria, nascia The Rollin’ Stones — nome tirado de uma música de Muddy Waters (a grafia definitiva, sem o apóstrofo, seria adotada pouco depois, por sugestão do empresário Andrew Loog Oldham).

Foi com essa formação que a banda fez sua primeira apresentação, em 12 de julho de 1962. Não demorou muito para Taylor e Chapman caírem fora. Considerado por Oldham feio demais para sair nas fotos da banda, Ian Stewart foi relegado aos bastidores — ele gravaria piano em discos do quinteto até 1985 (quando morreu de problemas respiratórios). O baixista Bill Wyman se juntaria aos Stones em dezembro daquele ano e o baterista Charlie Watts em janeiro de 1963 — até por isso, a banda está empurrando as comemorações de seu cinquentenário para 2013.

Ainda que os Stones tenham demorado algum tempo para se encontrar como compositores (o primeiro disco é feito de covers de blues, R&B e rock e apenas uma música de Jagger e Richards), a chegada ao cenário do pop rock britânico e, posteriormente, americano (e, paralelamente, mundial) foi bombástica. Num primeiro momento, eles foram comercializados como o oposto dos Beatles, bad boys mal vestidos, de cabelos desgrenhados e carregados de energia sexual (materializada no palco, em especial, pelo rebolado e pela bocarra de Mick Jagger). Eles eram os genros que os pais não queriam ter, mas que filhas eram loucas para levar para casa.

Satisfaction, lançada em 1965, foi a prova definitiva do poder de fogo dos Stones. A partir dali, os álbuns ganharam cada vez mais substância e originalidade. Os sons negros norte-americanos foram a matriz da sonoridade stoniana, no entanto, diferentemente de alguns de seus colegas de rock, o grupo não se limitava a pastiches. Jagger se mostrava um letrista cada vez mais prolífico. Jones (primeiro líder da banda) e, principalmente, Richards patenteavam riffs de guitarra incendiários. A c ozinha formada por Wyman e Watts formavam os pilares de uma construção inabalável. Em 1969, os Rolling Stones já eram chamados de a maior banda de rock do mundo. Quando os Beatles saíram de cena, no ano seguinte, eles estavam livre da concorrência para tomar para si o cetro e a coroa que carregam até hoje.

Comemorações

Os Stones são conhecidos por não fugirem da raia quando se trata de subir ao palco. Mesmo que Mick Jagger e Keith Richards estejam beirando os 70 anos, a vitalidade deles durante as apresentações ainda é impressionante. Nada mais justo, portanto, que, ao completarem 50 anos de carreira, eles presenteiem seu público com uma turnê mundial. Os boatos estão, assim como as pedras, sempre rolando. O guitarrista Ronnie Wood contou ao tabloide inglês The Sun que o grupo pode pegar a estrada no final deste ano. “Estou deixando outubro e novembro livres, foi o que me disseram”, revelou há alguns dias à publi cação.

Há indícios, também, de que os shows poderiam acontecer só em 2013, por conta da saúde de Richards, mas não há nada confirmado. Contudo, os aficionados pela banda podem esperar por duas produções cinematográficas e um livro de fotografias a ser lançado em 12 de julho. Um dos filmes é um documentário “oficial” dirigido por Brett Morgen, com bastante material inédito dos roqueiros, incluindo imagens de acervo pessoal. O lançamento está previsto para setembro. A outra película é uma adaptação do livro Exile on Main Street: A season in hell with the Rolling Stones, de Robert Greenfield. O roteiro será assinado por Richard Branson e Phil Murphy, e focará na relação entre as duas maiores estrelas da banda.

Músicas novas, disse Wood ao The Sun, estão fora de cogitação. “Estão brincando? Ainda estamos nos familiarizando com nosso catálogo antigo”, ironizou. “Bem, depois de 50 anos de carreira, confesso que não d á para esperar aquele frescor de décadas passadas. No entanto, o legado que os Stones deixam é tão impressionante que não se deve cobrar mais nada deles. O que vier agora é lucro”, defende o pesquisador Nelio Rodrigues, autor de livros sobre a banda.

Entrevista >> Nelio Rodrigues

“O mundo mudou depois de Satisfaction”

Antes de tudo fã da banda, Nélio Rodrigues é autor dos livros Os Rolling Stones no Brasil: do descobrimento à conquista e Sexo, drogas & Rolling Stones (editora Agir, 352 páginas, 2008) — este em parceria com José Emilio Rondeau. O primeiro, publicado em 2000, narra as aventuras da trupe e de seus integrantes em todas as passagens pelo país, entre 1968 e 1999. Já a parceria com Rondeau, mais abrangente, foca em passagens da trajetória da banda e saiu em 1998.

A paixão de Rodrigues pelos Stones foi à primeira audição: Satisfaction, no rádio, em 1965. “A guitarra distorcida, a batida forte e aquele grito de contracultura me fizeram entrar numa outra dimensão sonora”, relembra.

“Essa capacidade que a música teve de me abduzir, de me transportar para outro lugar, foi a causa dessa minha empatia com os Stones”. Ao lado dos Beatles, a banda de Mick Jagger e Keith Richards formava, para o pesquisador, “o quebra-cabeça da revolução musical que se deu nos anos 1960”, mesmo que uma fosse a perfeita antítese do outra. 

Como você avalia o amadurecimento musical dos Stones?

Eles misturaram blues, rhythm & blues, country, disco, ritmos latinos e embalaram tudo num punhado de discos geniais. É notável a evolução ao longo da primeira década de existência: de uma banda baseada num repertório predominante de covers da música negra americana, até virar a maior banda de rock do mundo, com canções próprias, que passavam pela psicodelia, o vaudeville, o country e as baladas acústicas, até os rocks com a marca dos riffs da guitarra de Keith, da força e do vigor do baixo e da bateria e da explosão de Jagger.

Quais momentos você destacaria como cruciais para a consagração da banda?

Com os Beatles encastelados no estúdio (e já quase no fim), os Stones acabam, acidentalmente, sendo anunciados como “a maior banda de rock do mundo” durante a turnê de 1969. O Festival de Altamont (em 69), embora confuso, pode ser ressaltado como importante: significou a débacle do idealismo de paz e amor dos hippies. Os anos 1960 chegavam ao fim e com eles uma era.

Você chegou a conhecer algum deles pessoalmente?

Já estive com Mick, Keith e Charlie, mas só em encontros fugazes. Lembro de quando Mick e Keith estavam hospedados no Copacabana Palace, entre 1968 e 1669. Apareci lá com meu irmão e dois amigos, entramos sem perguntar nada e subimos as escadas. Quando chegamos ao andar deles, vimos a namorada de Mick atravessar o corredor. Atrás dela, passou Keith. Os dois tinham saído de um dos apartamentos do hotel e deixaram a porta aberta. Fomos entrando e lá estava Mick com um violão. Quando nos viu, veio furioso e nos expulsou aos gritos, batendo a porta do quarto.

Linha do tempo

1962
Em julho, os então The Rollin’ Stones, depois de sua formação em maio, tocam pela primeira vez, no Marquee Club, em Londres. O repertório é todo de covers dos blueseiros Chuck Berry e Bo Diddley.

1964
É lançado o debute em disco de estúdio, de título homônimo da banda. Chega às lojas na Inglaterra em abril e, no mês seguinte — com ordem diferente das faixas —, nos Estados Unidos, com o subtítulo profético England′s newest hit maker s (“os mais novos criadores de hits da Inglaterra”).

1965
A banda acerta seu primeiro sucesso internacional, com (I can’t get no) Satisfaction, gravado em maio. Primeira canção da banda a chegar ao topo das paradas nos EUA.

1966
Com Aftermath, quarto disco de estúdio (e sexto lançamento nos EUA), os Stones chegam ao auge da forma. Brian Jones toca até cítara e marimba em algumas faixas, todas compostas por Jagger e Richards. Do álbum, saem clássicos como Lady Jane, Under my thumb e Paint it, black, esta incluída na versão americana.

1967
Os Stones conhecem a psicodelia e gravam Their satanic majesties request (dezembro), completamente produzido pelos músicos. Sucesso imediato, mas breve, foi comparado ao Sgt. Pepper`s Lonely Hearts Club Band (junho), dos Beatles.

1969
Em 3 de julho, Brian Jones, o cabeça da banda, é encontrado morto na piscina de casa, no condado de East Sussex, sudeste da Inglaterra. Pouco antes, saíra dos Stones pelo comportamento arredio e uso absurdo de drogas. Foi substituído por Mick Taylor.

1969
Sábado, 6 de dezembro. Data do trágico festival de Altamont, na Califórnia, organizado pelos Stones: três mortes (incluindo o assassinato de um jovem de 18 anos) e depredação do autódromo que abrigou os shows. O evento é registrado no documentário Gimme shelter (1970).

1972
Lançamento daquele que é considerado por muitos o melhor e mais ambicioso trabalho de estúdio dos londrinos, o LP duplo Exile on Main St.

1975
Ronnie Wood (ex-The Faces), amigo da banda, entra como segundo guitarrista após a saída de Mick Taylor. Antes, Peter Frampton e Jeff Beck também foram sondados.

2006
Em 18 de fevereiro, os roqueiros tocam em apresentação gr atuita para mais de 1 milhão de pessoas, na praia de Copacabana, Rio de Janeiro. Maior show da banda e um dos maiores públicos da história. O recorde pertence a Rod Stewart, que atraiu uma massa de mais de 3,5 milhões no réveillon de 1994, também em Copacabana.

Discografia

Com 29 álbuns de estúdio, fica complicado escolher os melhores discos dos Stones sem deixar vários clássicos de fora. Mas estes quatro são satisfação garantida:

Aftermath (1966)
Os Stones expandem sua sonoridade r&b com o uso de marimba (Under my thumb) e cítara (Paint it black está na versão americana do álbum). A banda nunca soou tão ensolarada (apesar da capa preta), caminho também de Between the buttons (1967).

Beggar’s banquet (1968)
Depois de um disco psicodélico, os Stones se reaproximam de suas raízes. Sympathy for the devil prenuncia o que seria o som do grupo nos ano s 1970.
Mas o destaque do disco é justamente seu lado mais acústico e pastoril (No expectations,Salt of the earth).

Sticky fingers (1971)
O característico som stoniano ensaiado em Let it bleed (1969) ganha corpo (a capa de Andy Warhol não deixa dúvidas) neste álbum. As canções são dançantes (Brown sugar), lascivas (Can’t you hear me knocking) e, quando preciso, românticas (Wild horses).

Exile on Main St. (1972)
Considerado por muitos fãs o melhor disco dos Stones, este LP duplo é fruto de uma temporada no inferno (drogas, egocentrismo e mortes rondaram a banda). Resultado: um passeio visceral por rock, blues, soul e country com liberdade e muito gás.

Do Diario de Pernambuco