A insustentável leveza de ser mãe | Raul Jungmann

A insustentável leveza de ser mãe

A foto ao lado eterniza o afeto de Ana Carolina, de 31 anos, pela filha Mariana, nascida prematuramente no dia 29 de dezembro de 2009. Uma história que desafia a lógica. Um nascimento que não foi o sonhado durante nove anos, mas o possível. Uma vida que não obedece à tradicional lógica da continuidade, mas que segue a imprevisibilidade. Uma história em suspenso, de espera e angústia. Uma primeira filha. Uma mãe de primeira vez. O ideal, o desejado, nunca aconteceu. 

Porque veio prematura, na 28ª semana da gestação e pesando apenas 600 gramas, “Mari” tem complicações sérias de saúde, que colocam a sua vida em risco constante. Mas mãe e filha vivem o afeto que lhes é possível – e não é pouco. Vivem o que cabe em cada partícula do tempo – mas que não dá para medir. Em cada cheiro, encontro na UTI, carinho na incubadora, voz sussurrada, foto feita no celular, elas vivem o imponderável, o afeto.

Mari não foi para o berçário quando nasceu. Não ficou à vista da família nem posou de roupinha nova para fotos, como idealizou a mãe. O ideal, o desejado, aliás, nunca aconteceu nessa primeira maternidade. Ana Carolina sequer pôde ver o rostinho da neném assim que deu luz. “Só no dia 30, à noite, conheci como ela era. Porque até aí, eu fazia uma imagem dela”, lembra a mãe. Aconchegar Mari no colo e dar de mamar apenas foram permitidos pela pediatra no segundo mês de vida da criança.

Ver Ana Carolina tocando com a ponta dos dedos o corpinho de Mari, hoje pesando pouco mais de dois quilos, mas frágil ao extremo na incubadora, é perder a noção do tempo. É eternizar o pouco possível. É encontrar outros sentidos de vida. “Já me perguntei muito por que estamos passando por isso, mas não tive resposta. Daria qualquer parte de mim à minha filha, para ela aguentar. Mas vamos até onde a medicina permitir e onde ela conseguir”, conta a mãe.

Ana Carolina aguarda a análise do médico pneumologista sobre a possibilidade de uma cirurgia em Mari, para diminuir a secreção sobre os pulmões, já fragilizados nos bebês prematuros (porque são órgãos que não amadureceram antes do parto). A prematuridade também traz falhas no coração, problemas gastrointestinais, riscos de hemorragias e infecções. “Dia a dia, querendo ou não, vou me preparando para o bom e para o ruim”, conta Ana Carolina, orgulhosa de guardar no celular fotos dos únicos – e eternos – sete dias em que Mari ficou fora do hospital, até hoje.