O presidente Lula saiu em defesa de uma carga tributária que, na realidade, pune todas as classes sociais no Brasil, inclusive os menos favorecidos. A carga brasileira de tributos, na faixa de 36% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de todos os bens e serviços produzidos), tem como componentes perversos o baixo retorno em serviços à sociedade e uma parcela de impostos indiretos que não faz distinção entre pobres e ricos e acaba punindo a população de renda mais baixa.
O Estado gastador retira da sociedade um montante de recursos equivalente ao de países ricos, como a Alemanha, por exemplo, mas o retorno está aquém desses países em relação aos serviços básicos, como saúde e segurança, ou à infraestrutura. Nos serviços públicos, estamos em situação pior do que alguns vizinhos, como o Chile, que tem carga em torno de 20%.
Tigres asiáticos têm carga de 10%, diz economista
A defesa do Estado forte com carga elevada de impostos, feita por Lula em reunião da Cepal, na terça-feira, não se sustenta, na visão de especialistas. Na contramão dos discursos dos presidenciáveis Dilma Rousseff, José Serra e Marina Silva – que defendem uma reforma tributária – Lula disse que só países com cargas altas conseguem fazer políticas sociais. O presidente disse que o país que tem carga tributária de 10% não tem Estado.
– Quem tem carga de 10% faz um país do tamanho da China – rebate o economista Paulo Rabello de Castro, presidente do Conselho de Planejamento Estratégico da Fecomércio-SP.
Castro diz que existem dois grupos de países com tributação no patamar de 10%: os tigres asiáticos (que têm carga entre 10% e 15% do PIB) e alguns países africanos e da América Latina, com muitas carências e baixo desenvolvimento. Lula se referiu ao segundo grupo.
Para o economista, o Brasil, com suas características, poderia manter um crescimento sustentando de 6% ao ano com uma carga tributária no patamar de 30%. Isso não acontece hoje porque o Estado é gastador e precisa de carga alta para financiar suas despesas:
– O Brasil tem um grande gastador chamado governo, que gasta o que o consumidor não gasta. Como o governo tira da mão de quem poupa para redistribuir como gasto, que não se transforma em investimento, é como enxugar gelo.
Rabello de Castro observa que essa parcela de impostos a mais que o governo retira do setor produtivo se transformaria em investimentos. E uma parte do imposto pago pelos assalariados poderia virar poupança, se a carga fosse menor.
Para o presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), João Eloi Olenike, a carga tributária alta acaba servindo para compensar a ineficiência do governo. A lógica é a seguinte: se caírem os impostos, os preços dos produtos vão cair e a população vai consumir mais. Mas como a infraestrutura atual (estradas, portos, aeroportos) não comporta aumento expressivo da produção e do consumo, o risco de aquecimento da economia e da volta da inflação precisa ser combatido.
Pobres pagam impostos sem saber, diz especialista
Olenike diz que a combinação de carga tributária elevada e falta de retorno adequado em serviços à sociedade torna a situação brasileira uma das mais perversas do mundo. O presidente do IBPT lembra que a classe média tem uma tributação indireta elevadíssima, pois paga altos tributos e ainda tem gastos com assistência médica privada, educação particular e segurança.
– Os países mais ricos (mencionados pelo presidente Lula) têm um retorno muito maior. Tudo que a população precisa o Estado provém.
Os mais pobres – que seriam os beneficiados com a carga de impostos elevada, segundo o discurso de Lula – também pagam os impostos indiretos embutidos nos preços dos produtos que consomem, destaca o presidente do IBPT.
– O povo não protesta, não se manifesta, porque não há transparência em relação aos impostos. Ninguém sabe exatamente quanto está pagando.