06.12.2015 | Raul Jungmann

06.12.2015

FOLHA DE PERNAMBUCO

Crise política do governo se evidencia em diversas frentes

O “CARDÁPIO” DE ACUSAÇÕES CONTRA A PRESIDENTE DILMA

O RISCO de afastamento de Dilma é real. Acuada, ela sofre processos judiciais variados, que isolam governo cada vez mais

MARCELO MONTANINI

O afastamento da presidente Dilma Rousseff (PT) é trabalhado em diversas frentes. De acordo com o pedido acatado pela Câmara Federal, o Executivo é acusado de crime de responsabilidade de fiscal, pelas ditas “pedaladas fiscais” e pela liberação de crédito suplementar sem autorização do Congresso Nacional, como está previsto em lei. Além disso, a reabertura da ação, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), contra supostas irregularidades na campanha eleitoral da petista, no ano passado, colocou mais um ingrediente à crise política atual. Ao longo destas investigações, inclusive, outros fatores podem pesar contra a presidente, como a controversa aquisição da Refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, as dificuldades econômicas que o País vive e até a turbulência na relação com o principal aliado, o PMDB, também observado por alguns como inimigo oculto.

No Congresso, segundo governistas e parte da oposição, o clima é de acirramento, propagado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDBRJ), que, com base legal ou não, tem utilizado este instrumento jurídico para tentar evitar a própria cassação no Conselho de Ética. O deputado federal Mendonça Filho (DEM), neste sentido, destaca que há fatos jurídicos que caracterizam crime de responsabilidade fiscal e, dentre os argumentos que pesam sobre o Governo, “esta é a maior recessão da história do Brasil republicano”.

O deputado Daniel Coelho (PSDB), por sua vez, pondera que a presidente perdeu credibilidade porque mentiu para a população, dizendo que não mexeria nos direitos trabalhistas e no aumento em contas básicas como água e energia. Ademais, o tucano recorda que “ela (Dilma) fazia parte da gestão (da Petrobras)” à época da compra de Pasadena, além da “utilização de recursos públicos sem previsão orçamental e autorização do Congresso”. Além disso, a relação entre petistas e peemedebistas, segundo Coelho, que estava boa até se descobrir os ilícitos, agora está desgastada.

Reforçando a tese de crime de responsabilidade fiscal, o deputado Raul Jungmann (PPS) ressalta que tal ilícito consta na legislação brasileira. Questionado sobre a recorrência deste ato em outras gestões, sem punição, Jungmann é incisivo: “o que os outros (FHC e Lula) fizeram antes não foi na profundidade e lesão que ela cometeu na lei”. Ele acrescenta que “o estelionato eleitoral corrobora para a queda de credibilidade” da petista. “Ela mentiu e camuflou a realidade econômica do País”, pontuou.

No entanto, a base governista defende que o pedido de impeachment não possui base legal para prosperar. O senador Douglas Cintra (PTB) avalia que o desgaste político gerou problemas econômicos. “Parte da crise advém da não aprovação de medidas que serviria para estabilizar o País. Se ela fizer melhorias (na economia), não haverá problemas ou impeachment, sobretudo, um impeachment motivado por revanchismo”, analisa Cintra, creditando parte do desgaste a uma ala do PMDB. “O partido é todo fragmentado, há vários partidos dentro do PMDB, mas há pessoas preocupadas com a governabilidade e com o País acima dos interesses pessoais”, acrescenta.

Já o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) argumenta que o mandato de Dilma foi conquistado nas ruas e, portanto, só pode ser tirado pelo povo. Todavia, observa que dois fatores são problemáticos para Dilma: a oposição e Cunha. “A oposição não admitiu a derrota eleitoral; e o presidente da Câmara está usando o cargo para se salvar”, avalia. Questionado sobre a sustentação do apoio peemedebista, Teixeira pondera: “o PMD nunca esteve unido em nenhum Governo, mas a liderança está conosco”.

 

 

CORREIO BRAZILIENSE

ENTREVISTA: JARBAS VASCONCELOS

“O PAÍS NÃO SAI DA CRISE COM DILMA E CUNHA”, DIZ JARBAS VASCONCELOS

Dilma não pode se fazer de inocente, porque ela participou disso. Quando achou que o preço era muito alto, aí desistiu. Ela permitiu que Cunha fizesse aquilo, oficializasse a chantagem. Ela está envolvida. Foi negociar com ele. Não pode se fazer de santinha

Aos 73 anos, o deputado federal Jarbas Vasconcelos é, ao mesmo tempo, opositor ferrenho de Dilma Rousseff e de Eduardo Cunha. Enquanto a maioria dos políticos do Congresso Nacional escolheu um lado na guerra entre a petista e o peemedebista, o ex-governador pernambucano critica com contundência a permanência de Cunha no comando da Câmara e defende com veemência o impeachment de Dilma. “Ele é um psicopata sem limites, que consumou um processo explícito de chantagem e assédio. Ela, por sua vez, permitiu que se fizesse aquilo, oficializasse a chantagem. Não pode estar se fazendo de santinha.”

Jarbas recebeu o Correio na quarta-feira — horas antes de Cunha acatar o pedido de abertura do impeachment de Dilma — e na quinta-feira, quando o Congresso já discutia uma eventual convocação extraordinária para contar prazos do processo. Na entrevista, ele avaliou as crises política, econômica e moral sem precedentes do país, o papel dos Três Poderes, a falta de qualificação de políticos da Câmara, um eventual governo de Michel Temer e revelou arrependimentos, como o de ter votado em Cunha para o comando da Casa no início da legislatura. “Eu devia ter procurado saber, até pela minha experiência. Eu errei, via o Cunha como um simples lobista, mas que tinha um discurso contra a hegemonia do PT”, disse ele, que é uma espécie de dissidente no PMDB, partido do qual foi fundador, ainda quando a legenda era chamada de MDB.

Ao longo da vida pública, o pernambucano Jarbas Vasconcelos alternou mandatos de deputado estadual, federal, senador, governador e prefeito do Recife. Nas urnas, ganhou de lavada para Miguel Arraes, mas perdeu de forma contundente, em 2010, para Eduardo Campos, neto do mitológico político. “Eduardo era um animal político, nós fomos para um total isolamento em Pernambuco; se persistíssemos naquilo, seríamos aniquilados nas eleições municipais de 2012”, disse Jarbas, que revelou pela primeira vez os bastidores da reaproximação com Eduardo Campos. A seguir os principais trechos da entrevista:

 

Derrotado de forma contundente por Eduardo Campos, ao final se aproximou dele. Como se deu isso?

Eduardo era um animal político qualificado. Só fazia política e  estava acima da média. Quando perdi as eleições para ele, em 2010, fomos para um total isolamento de Pernambuco, eu e os partidos que circundavam junto com a gente, PPS, com Raul Jungmann, Mendonça, do DEM. E conversávamos internamente, é a primeira vez que falo isso numa entrevista. Havia uma inquietação grande devido a esse isolamento, que não permitia um trânsito na sociedade. Se persistíssemos no isolamento em 2011, perto das eleições, seríamos aniquilados, desapareceríamos do mapa no estado, haja vista o processo que sofri em que Eduardo me triturou em todas as regiões e todos os municípios do estado que ele comandou.